sábado, 31 de março de 2007

Giuseppe Verdi: MESSA DA REQUIEM. CCB, 30 de Março de 2007

Já que, depois do maravilhoso concerto ao qual assisti ontem no Centro Cultural de Belém (CCB), não encontro, hoje, na comunicação social qualquer referência ao mesmo, venho, desta feita, aventurar-me no processo de análise daquilo que ouvi e vi, aliás, em excelente companhia.

Importa ressalvar que este texto não se constituirá como uma crítica musicológica científica, exacta e absolutamente fidedigna. Trata-se, sim, do meu sentir, enquanto ouvinte deste tipo de música, sem conhecimento teórico, apenas alguém que gosta de música e que tem um ouvido ainda muito inexperiente.

Comecemos por apresentar os intérpretes:

Soprano: Dimitra Theodossiou

Meio-Soprano: Gloria Scalchi

Tenor: Fabio Sartori

Baixo: Maurizio Muraro

Coro do Teatro Nacional de São Carlos, sob a direcção do maestro titular Giovanni Andreoli

Coral Lisboa Cantat, sob a direcção do maestro titular Jorge Carvalho Alves

Orquestra Sinfónica Portuguesa

Direcção Musical do maestro Donato Renzetti.

Do ponto de vista geral, tratou-se de uma interpretação muito equilibrada no que concerne às dinâmicas, tempo e cores.

Destacar o início do Introitus, com um arrepiante pianissimo pelas cordas e uma coordenação entre todos os executantes (característica, aliás de toda a interpretação). Uma harmonia sonora reveladora de uma maturidade musical característica de uma orquestra experiente e que recebo com grande alegria. Já no Dies Irae, bem como no Tuba Mirum, de destacar a força de uma secção de metais e percussão, mais uma vez muito coerente com a prestação, em fortíssimo dos Coros. Pianos súbitos fantásticos (mérito, também, da brilhante condução de Donato Renzetti) a introduzirem o Baixo Maurizio Muraro que cumpriu com as obrigações da partitura, sem no entanto, e na minha opinião, se destacar. Quanto ao Liber Scriptus proferetur (para mim, a grande prova da meio-soprano ao longo de toda a obra) foi interpretado por Gloria Scalchi com aparentes dificuldades de projecção da voz, resultado, quiçá de uma má adaptação à acústica da sala, ou a uma voz que me pareceu pouco cheia no registo grave e que, por isso, se dissolvia no meio dos vários mezzo-forte e fortissimi da orquestra ao longo de toda a obra. Pena que tenha sentido a necessidade de prescindir dos vibrati, em passagens de registo agudo forte. Para Verdi são imprescindíveis cantoras com timbres mais escuros e redondos, naturalmente, com um registo médio e grave bem sustentados.

Quanto ao Ingemisco, Fabio Sartori interpretou-o com facilidade e boa projecção vocal. Obviamente que o meu ouvido, habituado a ouvir o Requiem em disco e, como tal, através de vozes como as de Pavarotti, di Stefano, entre outros, sente falta de timbres com mais cores e beleza. No entanto, Sartori desempenhou as suas passagens com honestidade e facilidade, mesmo no registo mais agudo e piano.

Gostava, agora, de fazer referência a Dimitra Theodossiou, soprano que temos a felicidade de receber, muitas vezes ao longo da temporada, em São Carlos. Referi atrás que Verdi carecia de vozes escuras e redondas. Este soprano tem, de facto, essas qualidades. Confesso, todavia que me assustei um pouco ao ouvi-la e, depois de reler o seu repertório habitual ainda fiquei mais assustado. A voz tem vindo a ganhar peso e a escurecer, ao mesmo tempo que, na minha opinião (repito: que é falível) ganha um certo descontrolo sobre o vibrato que imprime, nomeadamente, aos agudos, gerando-lhe algumas dificuldades na acuidade da afinação em momentos em que a claridade da nota, mais uma vez em agudo pianissimo, é essencial (refiro-me, mais especificamente ao Libera me). À parte destes pormenores, trata-se de uma timbre muito belo, provavelmente o mais belo dos quatro cantores que se nos apresentaram ontem à noite (se é que é legítimo comparar timbres de tessituras distintas).

Creio, à parte de tudo isto, que as grandes estrelas da noite foram a nossa Sinfónica e os coros e, sobretudo, o maestro. Destaca-se a qualidade dos metais e dos excelentes percussionistas, assim como a doçura das cordas, em especial o concertino, que, na sua curta prestação em solo, já fez valer a noite. É com regozijo e grande orgulho que verifico a excelência da execução da nossa principal orquestra nacional, assim como os dois Coros, ambos conduzidos pela batuta de Renzetti que, nas várias vezes que o escutei em São Carlos nunca me desiludiu. Muito positiva a decisão de o termos como Primeiro Maestro Convidado no Teatro Nacional de São Carlos...prenúncio de muito sucesso e desenvolvimento musical.

Resta-me agradecer à companhia que me (passo o pleonasmo) acompanhou e que espero ter apreciado o momento tanto ou mais do que eu...foi importante.

Que se repita!

Interpretações recomendadas:

CDs:

DVDs:

  • Angela GHEORGHIU; Daniela BARCELLONA; Roberto ALAGNA; Julian KONSTANTINOV; Swedish Radio Chorus; Eric Ericsson Chamber Choir; Orfeón Donostiarra; Berliner Philharmoniker; CLAUDIO ABBADO
  • Leontyne PRICE; Fiorenza COSSOTTO; Luciano PAVAROTTI; Nicolai GHIAUROV; Coro del Teatro alla Scala; Orchestra del Teatro alla Scala; HERBERT VON KARAJAN
  • Anna TOMOWA-SINTOW; Agnes BALTSA; Jose CARRERAS; Jose VAN DAM; Wiener Staatsopernchor; Wiener Philharmoniker; HERBERT VON KARAJAN

4 comentários:

Dininha disse...

Bem não posso deixar de comentar esta experiência que de facto foi belíssima. Devo dizer que o espetáculo, com melhores ou menos bons pormenores técnicos e musicais que o meu querido Gaspar sobe tão bem destacar, é sempre digno de ser assitir. Em termos visuais é lindissimo, em termos auditivos fascinante. De facto há pessoas com talentos inusitáveis que são dignas de destaque.
Por outro lado a surpresa de ter uma orquestra sinfónica da minha cidade com tamanha qualidade: reconheço a capacidade dos portuguesas para tal, mas desconhecia a sua existência com este vigor.
Por fim, e também porque já me alongo, só para rematar com a necessidade que este tipo de espetáculos fazem à nossa socidade. Que falta fazem que seja acessível a todos!
Parabéns. Bem-haja.

Artemis disse...

Hello!
Do You speak english? I would like to know how did You find the mezzo Gloria Scalchi (in the requiem). Unfortunatly I don't understand portugal language. Hope You'll answer to me...
Regarts,

OracularRose

Gasparzinho disse...

I'm sorry but I'm not very good in English, but I've tried to translate the part of the text related to Gloria Scalchi. I hope you'll understand it.

"The Liber Scriptus proferetur (for me, the great test to the mezzo-soprano throughout the Requiem) was interpreted by Gloria Scalchi with apparent difficulties of voice projection, caused perhaps by a bad adaptation to the acoustics of the room, or because her voice wasn’t full enough in the lower register and therefore was dissolved in the mezzo-forte and fortissimi of the orchestra throughout all the Requiem. Pity that she has felt the necessity to left vibrati, in strong acute passages. In Verdi it’s essential darker and round voices, of course, with a strong average and lower register."

Regarts to you too.

Artemis disse...

Hello!

Thank You SO MUCH for the translation. Do You know maybe if I can find other reviews on the net about that concert? Maybe some critics from the newspapers? Regards,

OraularRose